JORGE RODRIGUES SIMAO

ADVOCACI NASCUNT, UR JUDICES SIUNT

A odisseia da dívida pública grega (I)

What Pisses Me Off About Greece's Debt Crisis

BCE dividido na decisão de não aceitar dívida grega

Bancos perdoam 50% da dívida grega

DívidaGrega

HOJEMACAU - PERSPECTIVAS

“The single European currency, the euro, consists of 17 dissimilar economies, and has failed to create a unified currency area. The difference between surplus and deficit nations has widened, in a repeat of earlier experiments. The dramatic announcement of 9 May 2010, including an unprecedented liquidity package of more than €750 billion and the abandonment of the European Central Bank's independence through bond purchases, confirms that the euro was mis-sold as an enterprise to the continent's citizens. The 'peripheral' countries of the eurozone face years of severe austerity measures with an uncertain chance of success, placing strains on their political systems and even on public order.”

Greece's 'Odious' Debt: The Looting of the Hellenic Republic by the Euro, the Political Elite and the Investment Community

Jason Manolopoulos

A Europa segundo a mitologia nasceu na Ásia, tendo sido a heroína da imaginária aventura cantada por gregos e latinos. A Europa, filha do rei fenício Agenor, devido à sua extrema beleza, foi raptada pelo deus Zeus, incarnado sob a forma de touro, e levada para a Ilha de Creta, onde desabrochava a mais refinada civilização mediterrânica.

A origem leva-nos a Homero que utiliza o étimo grego, Europé, o que vê ao longe, como epíteto para designar o pai e senhor dos deuses. A primeira noção geográfica da Europa, assim como, o seu termo é legado dos gregos, começando por designar as terras ao Norte da Grécia.

 

A Grécia no meio da mais profunda crise da sua história moderna vai a eleições legislativas, a 25 de Janeiro de 2015. A campanha eleitoral é marcada por uma profunda raiva de mudança, liderada pelo partido Syriza, e pelo conformismo da desgraça sem saída e do descrédito nos políticos, representada pela abstenção endémica de 36,16 por cento, mas que conseguiu descer dos 38,15 por cento, registados aquando das eleições legislativas de 2012. Existem países como a Grécia, em que a abstenção se transformou numa instituição.

O Syriza ganhou as eleições legislativas, obtendo 36,34 por cento dos votos, traduzido em 149 deputados, de um Parlamento de 300 membros, deixando-o a uma distância ínfima da maioria absoluta. O partido Nova Democracia, liderado pelo ex-primeiro Antonis Samarás, obteve o segundo lugar, com 27,81 por cento dos votos, seguido pelo partido neonazi Amanhecer Dourado, com 6,28 por cento dos votos.

O partido To Potami obteve 6,05 por cento dos votos, seguidos do partido Comunista, com 5,5 por cento dos votos, do partido populista de direita nacionalista e anti-austeridade (ANEL), com 4,8 por cento dos votos e do partido Socialista, com 4,7 por cento dos votos. 

Os partidos mais castigados foram a Nova Democracia por governar o país em austeridade desde 2012 e o partido socialista por o ter apoiado. Após o conhecimento do resultado das eleições, o vice-presidente do grupo socialista do Parlamento Europeu (PE), sugeriu ao partido vencedor, a formação de uma forte coligação pro-europeia, afirmando que os resultados na Grécia demonstravam que a renegociação da dívida grega não deveria ser considerada um assunto sagrado.

A tentativa de forçar uma aliança entre o Syriza e o Pasok para limpar a esmagadora derrota socialista e a sua imagem, veio a ser confirmada pela rápida visita do Presidente do PE, Martin Schulz, alemão, membro do Partido Social-Democrata da Alemanha (SPD), filiado na Internacional Socialista e que foi desde 2004 a 2012, coordenador da bancada socialista. A tentativa forçada da coligação entre o Syriza e o Pasok veio mostrar o apoio do PE às políticas anti-austeridade e abre a porta à renegociação da dívida grega.

A vitória clara do Syriza, se acaso não vier a enfraquecer na luta contra a dura batalha que o espera nas instituições europeias e dependendo da flexibilidade destas, poderá vir a dar lugar efectivamente à existência de um verdadeiro governo e presidente gregos que não sejam meros delegados da Chanceler Alemã, e que considere os interesses gregos como primários, ao contrário de outros países, do qual infelizmente Portugal é paradigma.

Os gregos votaram pela mudança, mas não na continuidade. A mudança é contra a austeridade imposta. Só é possível fazer face às dívidas impagáveis com políticas de prosperidade. A Grécia necessita de um plano distinto ao que se fez e não deu resultado. As políticas de austeridade não funcionaram na Grécia, como não funcionam em nenhum país, devendo ser a mensagem fundamental na Europa.

É vitória não desejada que mantém a Europa de vigília, pois pode bem ser o começo de graves rupturas nas políticas do Velho Continente. O Syriza após a sua vitória eleitoral mostrou que algo de profundo pode mudar na Europa e que é possível terminar com cinco anos de humilhação e de soberania controlada por terceiros.

O Syriza pode fechar o círculo vicioso da austeridade, pressupondo o difícil e por vezes impossível cancelamento dos memorandos da austeridade e do desastre vivido e prognosticado. A resposta do povo grego expressa nas urnas será no sentido de que a “troika" seja substituída por uma instituição dentro do modelo europeu comum.

É ainda muito cedo para determinar qualquer tipo de vitória, e a existir será certamente de todos os países da Europa que lutam contra a austeridade que só destrói o futuro comum. É de aplaudir a irreverência do governo grego que está disponível a negociar e cooperar com os demais Estados Membros, parceiros da integração económica e política que constitui a União Europeia (UE), de forma a encontrar uma solução sustentável e justa para que Grécia saia do círculo vicioso do endividamento e regresse à coesão social.

O programa político do Syriza conquistou o povo grego, como conquistaria qualquer outro na Europa, afectado enormemente pela grave situação económica do país e desejoso de mudança. O Syriza é inimigo declarado das políticas de austeridade, e o seu líder manteve durante a campanha a sua intenção de que Grécia permaneça na “Zona Euro”, não obstante, defender uma reestruturação da dívida pública de duzentos e quarenta mil milhões de euros e uma renegociação do resgate.

O Syriza defende uma subida das pensões ou duplicar o salário mínimo. Quanto às medidas para activar o mercado laboral, o líder do partido assegurou que criará um plano onde será inscrita uma dotação orçamental de cinco mil milhões de euros destinados à criação de emprego e que será financiado por fundos europeus. A fim de acabar com o desemprego juvenil, aposta em programas públicos.

O Syriza prometeu impedir o plano de demissão de cento e cinquenta mil trabalhadores do sector público e acordado entre o anterior governo e a “troika”. O programa político do Syriza, advoga uma política de imigração comum na UE, que compatibilize a segurança pública face à ameaça de uma possível entrada de terroristas no país, com as liberdades individuais.

O líder de Syriza formou governo e tomou posse como primeiro-ministro, a 26 de Janeiro de 2015, após uma rápido acordo com o ANEL que partilha o mesmo objectivo de resgate da soberania nacional e intenções no que diz respeito à dívida pública. O Eurogrupo, reuniu-se no mesmo dia, tendo discutido os resultados das eleições gregas. Os responsáveis pela Economia da “Zona Euro” discutiram o prolongamento do resgate grego, que termina a 28 de Fevereiro de 2015, pelo que em Março os bancos gregos não teriam condições para se refinanciarem e teriam de fazer face ao vencimento dos créditos e juros que ultrapassam os cinco mil milhões de euros.

A Grécia deve apresentar à Comissão Europeia, uma solicitação formal para que uma nova extensão se produza, o mais rapidamente possível. O prazo de prolongamento do resgate deveria ser igualmente discutido. Assim, pressupõe-se que o tempo de prolongamento que se proponha seja no mínimo de seis meses. A Grécia será afectada pela decisão do Banco Central Europeu (BCE) que, segundo o seu novo programa, não poderá comprar dívida grega até Julho.

A Comissão Europeia confia na responsabilidade do governo grego que deverá ter em conta o melhor interesse para a sociedade do seu país e que tratará de minimizar os futuros riscos, derivados da instabilidade económica do país. Os ministros da Economia da “Zona Euro” no final da reunião, emitiram um comunicado, pedindo ao governo grego que respeitasse os compromissos assumidos com a UE em matéria de ajustes e reformas. Todavia, mostraram abertura para renegociar o resgate do país e reestruturar a dívida, não o fazendo apenas, se a Grécia não cumprisse as condições impostas pela “troika”.

O presidente do PE deslocou-se à Grécia, a 29 de Janeiro de 2015, para uma primeira abordagem com o primeiro-ministro grego acerca do polémico tema da dívida pública, tendo concordado que a vitória do Syriza constituía uma grande mudança para o país e que teria um impacto forte na Europa, mostrando-se impaciente para discutir os numerosos aspectos relativos ao memorando da “troika”.

A renegociação da dívida pública grega é uma das prioridades do governo grego. O presidente do PE não exclui a hipótese da renegociação, realçando que não existia a possibilidade de qualquer tipo de chantagem por parte do governo grego, pois o país está completamente dependente do financiamento comunitário.

O presidente do PE partilha a ideia possível, em lucidez, de que a austeridade não é a solução para a crise da Europa. Tendo por base tal pensamento, os gregos pretendem a celebração de um novo pacto europeu que ajude a relançar a captação de investimentos, um pacote complementar ao denominado de “Plano Juncker”.

O perdão da dívida na sua totalidade ou em parte está fora de questão, porque teria efeito dominó e seria o desagregamento da “Zona Euro”, pelo que, resta renegociar a prorrogação da dívida e ligá-la ao crescimento como pretendem os gregos, o que se torna igualmente difícil, pelas consequências que teria nos países mais endividados a terem de ser contemplados, e sempre que o crescimento fosse nulo ou negativo não existiria pagamento.

A renegociação da dívida grega irá dar-se como medida extrema de coesão da “Zona Euro”, desde que a Grécia não tome medidas unilaterais, em impulso de euforia eleitoralista e que procure as soluções dentro do sistema europeu comum. Algumas medidas foram entretanto, tomadas pelo governo grego em termos de política social, que segundo o pensamento errado e austero da Comissão Europeia e do BCE são condenáveis nesta fase, pois às instituições europeias importa mais uma política fiscal dura, nomeadamente, quando ao combate à evasão fiscal, ao invés de uma política social complacente.    

 

 

Jorge Rodrigues Simão, in “HojeMacau”, 10.02.2015
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