JORGE RODRIGUES SIMAO

ADVOCACI NASCUNT, UR JUDICES SIUNT

Estranhos na sociedade que aliena

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 NEW YORK,NEW YORK

alienação 

“What, indeed, is a New Yorker? Is he Jew or Irish? Is he English or German? Is he Russian or Polish? He may be something of all these, and yet he is wholly none of them. Something has been added to him whom he had not had before. He is endowed with briskness and an invention often alien to his blood. He is quicker in his movement, less trammeled in his judgment...The change he undergoes is unmistakable, New York, indeed, resembles a magic cauldron. Those who are cast into it are born again.”

American Sketches

Charles Whibley

 A cidade de Nogales é dividida ao meio por um muro com arame farpado, pertencendo a parte norte ao condado de Santa Cruz, estado do Arizona e a parte sul é um município do estado de Sonora, no México. Sendo irmãs umbilicais, a sua economia e estrutura político-social é muito diferentes, criando uma desigualdade única na economia do Rio Grande que faz a fronteira entre os Estados Unidos e o México.

A cidade americana tem um rendimento médio anual por família de cerca de trinta mil dólares. A maioria dos adolescentes frequentam a escola e a maioria dos adultos completaram o ensino médio.

Apesar de todas as críticas e argumentos levantados contra o deficiente sistema de saúde dos Estados Unidos, a população é relativamente saudável, com uma alta expectativa de vida para os padrões globais. Muitos dos habitantes tem idade acima dos cinco anos e acesso ao “Medicare” que é um sistema de seguros de saúde, cujos beneficiários são pessoas de idade igual ou superior a 65 anos, ou que tenham um determinado rendimento, ou portadores de deficiências, ou ainda em estado final de doença renal.

O “Medicare” é um dos muitos serviços que o governo americano presta, tal como a energia eléctrica, telefones, sistema de esgotos, saúde pública, rede viária que os ligam a outras cidades da região e ao resto dos Estados Unidos, bem como mantém a lei e a segurança.

A população da cidade americana pode exercer as suas actividade diárias sem ter de recear pela sua vida ou segurança e sem estarem continuamente ansiosas com medo de serem roubadas ou expropriadas, ou de outra qualquer situação que possa comprometer os investimentos realizados nos seus negócios ou moradias.

Os habitantes da cidade americana, tem como dado adquirido, apesar da ocasional ineficiência e corrupção, de o governo os representar. Têm o direito de votar e substituir o presidente da municipalidade, deputados e senadores, bem como exercer o mesmo direito nas eleições presidenciais que determina quem vai governar o país. A democracia é a sua segunda acepção ou natureza.

A poucos metros de distância a sul, a vida na cidade mexicana é muito diferente. Os seus habitantes, ainda que vivendo num dos locais mais prósperos do México, o rendimento médio anual por família é um terço do auferido na cidade americana. A maioria dos adultos não tem o ensino secundário completo, e muitos adolescentes não frequentam a escola.

As mães têm de se preocupar com as altas taxas de mortalidade infantil. As más condições de saúde pública não causam surpresa pelo facto dos moradores da cidade mexicana não terem uma vida tão longa como a dos seus vizinhos americanos, assim como não têm acesso a muitos outros serviços e equipamentos públicos. As estradas estão em péssimo estado ao sul do muro.

A lei e a segurança estão em piores condições. A taxa de criminalidade é alta, e exercer uma actividade comercial é algo de arriscado, correndo os comerciantes não apenas o risco de serem roubados, mas para obterem todas as autorizações necessárias à licença de exercício da actividade têm de “olear” muitas mãos, não sendo por consequência uma tarefa fácil.

Os habitantes da cidade mexicana, convivem diariamente com políticos corruptos e ineptos, onde em contraste com os seus vizinhos do norte, a democracia é uma experiência muito recente. A cidade mexicana, assim como o resto do México esteve sob controlo do corrupto Partido Revolucionário Institucional (PRI) que deteve o poder desde 1929 até 2000.

As reformas políticas apenas surgiram após 2000, quando o candidato do PRI foi derrotado nas eleições presidenciais de 2000, por Vicente Fox Quesada, do Partido da Acção Nacional. O PRI conquistou novamente o poder nas eleições presidenciais de 1 de Julho de 2012, com a eleição de Enrique Peña Nieto, como presidente.

A questão que se coloca é a de saber como podem as duas partes do que é essencialmente a mesma cidade serem tão diferentes? Não existem diferenças geográficas, de clima ou de tipos de doenças predominantes na zona, uma vez que os vírus e bactérias não sofrem quaisquer restrições nos seus percursos de ida e volta entre os Estados Unidos e o México.

As condições de saúde entre as duas cidades são muito diferentes, não sendo de considerar em alto grau, o factor ambiental da doença, apesar dos habitantes da cidade mexicana viverem em condições sanitárias inferiores e não terem um digno sistema de cuidados de saúde.

A resposta não está no facto dos habitantes de ambas as cidades serem muito diferentes, nem pelo no facto dos habitantes da cidade americana serem descendentes dos imigrantes provenientes da Europa e os habitantes da cidade mexicana serem descendentes dos astecas. 

A origem das pessoas de ambos os lados da fronteira é bastante semelhante. Após o México se tornar independente de Espanha em 1821, a zona ao redor das duas cidades fazia parte do estado mexicano da “Velha Califórnia” e assim permaneceu após a guerra mexicano-americana de 1846 a 1848, baseada na ideia de que a América tinha um direito natural atribuído por Deus, de alargar as suas fronteiras de costa a costa.

O resultado foi o facto dos Estados Unidos terem alargado o seu território em um quarto e o México perder metade da sua superfície. A compra de Gasden, em 1953, que constitui o sul dos actuais Estados de Arizona e Novo México fez estender a fronteira dos Estados Unidos a essa zona.

O belo vale das duas cidades divididas foi descoberto por mero acaso por um oficial do exército americano, quando fazia o levantamento da fronteira entre os Estados Unidos e o México e foram depois construídas as duas cidades dado ser um local privilegiado.

 Os habitantes das duas cidades têm efectivamente a mesma cultura, pois têm antepassados comuns, gostam da mesma comida e música. Existe uma explicação simples para a existência de diferenças entre as duas cidades e que consiste na sua fronteira.

A cidade americana beneficia da existência das instituições económicas do país que permite aos seus habitantes escolher de forma livre a sua profissão e a ter acesso à instrução e formação. Os empregadores são incentivados a investir na melhor tecnologia disponível.

Os trabalhadores recebem melhores salários, tem acesso às instituições políticas, podendo participar desse modo no processo democrático, eleger os seus representantes e os substituir quando violem as regas do jogo democrático. Os políticos providenciam os serviços básicos, desde a saúde pública à rede viária, passando pela lei e segurança dos habitantes.

 Os habitantes da cidade mexicana não desfrutam da mesma sorte, pois vivem num diferente mundo, regulado por instituições distintas, que criam estímulos muito divergentes entre os habitantes das duas cidades e para os investidores e empresas que queiram investir.

Os incentivos criados pelas distintas instituições das duas cidades e dos países a que pertencem cada uma são a resposta para a diferença económica e político-social dos dois lados da fronteira.

Existem mais de onze milhões de imigrantes ilegais nos Estados Unidos, dos quais 60 por cento são mexicanos, importando uma despesa anual de dez mil milhões de dólares, a triplicar se a situação for legalizada. A fronteira entre os Estados Unidos e o México separa o mundo rico do pobre e tem uma extensão de cinco mil quilómetros, controlado continuamente por guardas altamente treinados e sofisticado equipamento electrónico.

A segurança fronteiriça existente não impede que diariamente milhares de mexicanos e outros sul-americanos tentem a sua sorte, levando a uma explosão demográfica sem precedentes, pois além dos mexicanos, são multidões de pessoas de outros países que se dirigem à mesma região, criando grandes locais de pobreza.

A continuar este ritmo de imigração ilegal, nos próximos 25 anos é de prever que 40 por cento da população mexicana viva junto à fronteira com os Estados Unidos. A fronteira é um foco também de conflitos permanentes não apenas pela imigração ilegal, mas pelo tráfego de drogas, armas e branqueamento de capitais.

A prosperidade económica faz que muitos habitantes e recém chegados de toda a América do Sul à cidade mexicana de Nogales tentem passar para a cidade gémea do norte, sendo muitos mortos pela guarda e fazendeiros americanos. Um fazendeiro segundo registos oficiais, deteve três mil imigrantes ilegais em cinco meses. À cidade americana a despesa com processos relacionados com acusações, roubos e outros delitos são superiores a 16 milhões de dólares anuais.

 O êxito económico dos Estados Unidos que faz correr os imigrantes ilegais reside no facto das suas instituições terem maior capacidade para atingir tal fim e à forma como as sociedades se formaram no período colonial. A diferença institucional que continua a existir só pode ser entendida com o estudo da fundação das colónias nas Américas.

 

Jorge Rodrigues Simão, in “HojeMacau”, 07.06.2013

 

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