“Two days earlier, on November 17, 2010, Congressman-elect Jeff Duncan sat in the Capitol with the entire House Republican conference for the first time. Before the election fifteen days prior, there had been 198 of them. Now there were - or would be, after all the recounts were completed-242. They were the majority. They were the one sector of the federal government that the Republicans controlled outright, making the House their spear point against the Obama White House.”
Do Not Ask What Good We Do: Inside the U.S. House of Representatives
Robert Draper
Os Estados Unidos considerados responsáveis pelo desencadear da maior crise sistémica Ocidental de 2007-2008 e do capitalismo, inicia o ano na perspectiva de um agravamento da recessão, se a partida de “poker” orçamental não for favorável ao presidente americano nas batalhas que se avizinham, pela aprovação da proposta de lei orçamental. O Senado, após longas e agónicas negociações entre democratas e republicanos aprovou por maioria um acordo orçamental, quando tecnicamente está em vigor desde 1 de Janeiro, de forma automática, o denominado “fiscal cliff” ou “precipício orçamental”.
O acordo orçamental consiste num pacote de medidas fiscais, que aumentam os impostos de 35 por cento para 39,6 por cento relativamente aos rendimentos das pessoas singulares acima dos 400 mil dólares anuais, abrangendo os casais com rendimentos superiores a 450 mil dólares anuais. São aumentados igualmente, os impostos sobre os ganhos de capital e dividendos para as mesmas famílias, passando de 15 por cento para 20 por cento. É também aumentado, o imposto sobre o património das fortunas superiores a 5,12 milhões de dólares que era de 35 por cento, passado para 40 por cento sobre as fortunas superiores a 5 milhões de dólares.
É limitado o valor das isenções pessoais e o de deduções que estão descriminadas, duas restrições, que se aplicariam a pessoas singulares com rendimento anual de 250 mil dólares e casais com rendimento anual de 300 mil dólares. Tais limites não existiam desde 2010. É adiado pelo período de sessenta dias, parte dos 110 mil milhões de dólares em cortes de despesas que tecnicamente entraram em vigor a 1 de Janeiro e que seriam substituídos por aumentos de impostos e cortes em outros programas.
O acordo orçamental congela os salários existentes dos membros do Congresso durante o ano fiscal em curso, não abrangendo os salários dos trabalhadores do governo federal. Inclui ainda uma disposição que impede um grande aumento no preço do leite que era temido no início do ano, e estende alguns outros programas agrícolas até Setembro.Aos rendimentos inferiores continuam a ser aplicadas as taxas vigentes. É contemplado um aumento da taxa que incide sobre os salários que passará de 4,2 por cento para 6,2 por cento. Esta taxa é fixa, e aplicada a salários até ao montante de cerca de 114 mil dólares anuais que é suportada pela entidade patronal, mas que se reflecte no montante líquido dos vencimentos auferidos pelo trabalhador.
Ainda que não sendo resolvida de forma definitiva a situação, é evitado “in extremis” por ora, um aumento geral dos impostos que atingiriam potencialmente a classe média. O acordo orçamental quanto ao aumento de impostos foi aprovado dia 2 pela “Câmara de Representantes” com 275 votos a favor e 167 votos contra. O Congresso, nos Estados Unidos, é constituído pelo Senado (Câmara Alta) e pela Câmara de Representante (Câmara Baixa). O Congresso detém o poder legislativo do governo federal e têm por atribuições entre outras, a de criar impostos, o de controlar o nível de endividamento do Estado. No final de Fevereiro ou início de Março, o governo federal precisará de uma nova autorização quanto ao aumento do limite da dívida.
Todavia, parece que de momento os Estados Unidos conseguem escapar ao “precipício orçamental”, que seria uma redução da despesa pública e uma subida dos impostos. Esta denominação foi usada pelo presidente da Reserva Federal, Ben Bernanke, numa sua intervenção no Congresso. O “precipício orçamental” resulta do facto do Congresso aprovar um limite máximo de endividamento e quando é atingido aprova um novo limite. O Congresso, aprovou em Agosto de 2011, um aumento do limite da dívida no montante de 2,1 mil milhões dólares, mas os republicanos conseguiram introduzir uma condição no sentido de ser negociado um compromisso para reduzir o deficit. A condição prevê o acordo de ajustamento do deficit de cerca de 800 mil milhões de dólares, que devia ser realizado antes do passado dia 31 de Dezembro de 2012.
Se não fosse possível tal acordo, entrariam em vigor cortes da despesa no valor de cerca de 500 mil milhões de dólares e aumentos nos impostos num total previsto de 85 mil milhões de dólares. Seria muito difícil, senão impossível, os Estados Unidos arrecadar todos esses colossais montantes num ano com o ajuste. O “precipício orçamental” conduziria os Estados Unidos a um aprofundamento grave da recessão, e daí que a arrecadação dos impostos e os denominados estabilizadores automáticos, como o subsídio de desemprego e a ajuda a pessoas mais carenciadas diminuiria incomensuravelmente.
Os Estados Unidos atingiram o limite máximo de 12,4 mil milhões da dívida autorizada em Agosto de 2011, que quase criou o incumprimento de pagamentos. A entrar de facto no “precipício orçamental”, o Tesouro teria apenas uma capacidade de cerca de 150 mil milhões de dólares para continuar a pagar a dívida, até atingir o limite em algumas semanas. A essa realidade esperam os republicanos conseguirem cortes na despesa. O deficit dos Estados Unidos no ano fiscal que terminou a 30 de Setembro de 2011, foi de 1,089 mil milhões de dólares, representando 7,3 por cento do PIB.
A evolução do deficit tem sido positiva. O desequilíbrio foi reduzido em cerca de 16 por cento, apesar da economia não ter acelerado a sua taxa de crescimento. É de considerar que cerca de 30 por cento do deficit é cíclico, devido ao baixo crescimento da economia, que impede a arrecadação de impostos e à alta taxa de desemprego. Esta situação é de histeria política, uma vez que cinquenta e cinco republicanos da “Câmara de Representantes” opõem-se totalmente a qualquer aumento dos impostos e preferem que o país entre no “precipício orçamental”. É essa última rebelião dos republicanos e o descontentamento de uma parte dos democratas que faz prever dois meses difíceis e a batalha decisiva em final de Fevereiro ou início de Março.
Se por remota hipótese os Estados Unidos entrassem no “precipício orçamental” seria a falência da primeira economia mundial e o fim do mundo tal é e como o percebemos. As repercussões na “Zona euro” seriam de imediato sentidas, com uma redução do crescimento que em termos optimistas, podia ir até 1 por cento no corrente ano. O acordo sobre a lei orçamental celebrado entre democratas e republicanos resume-se a cinco factos políticos; o primeiro de que o presidente americano perdeu estas negociações, pois o programa político da sua reeleição continha a promessa de aumentar os impostos aos que auferiam rendimentos superiores a 250 mil dólares anuais, e aumentou apenas aos que auferiam rendimentos anuais superiores a 450 mil dólares anuais, o que representa menos de 1 por cento da população activa, bem como adia as ajudas aos desempregados, mães solteiras e ao sector da energia renovável.
O segundo facto é que o “precipício orçamental” tem mais possibilidades de se dar no início de Março, por força do acordo celebrado, pois as negociações irão ser bem mais duras e certamente os republicanos não irão perder a única oportunidade de conseguir reais e efectivos compromissos quanto à redução da despesa pública. O presidente americano quer aumentar mais os impostos a quem aufere mais rendimentos e ao mesmo tempo limitar a reforma das pensões públicas e dos sistemas de saúde social aos idosos e às pessoas de menores recursos (Medicar – sistema de seguros de saúde social em que os beneficiários são empregados idosos de 65 ou mais anos de idade e que tenham baixos rendimentos, e o Medicaid – sistema de seguros de saúde social em que os beneficiários são aposentados que provem encontrar-se em situação de pobreza e as pessoas mais carenciadas. O sistema beneficia por exemplo, algumas dezenas de milhões de crianças).
As próximas negociações serão decisivas e poderá acontecer uma reclassificação com rebaixamento da qualificação da dívida americana. O terceiro facto é que o acordo evitou um aumento generalizado dos impostos para a maioria dos americanos, não ajudando a resolver a situação do deficit, antes pelo contrário, o vem prejudicar, pois aumentará em cerca de quatro mil milhões de dólares, como consequência do adiamento dos cortes das despesas públicas e confirma as taxas de impostos que não irão em nada favorecer a despesa social, nomeadamente as pensões e a previdência social, como política pública componente da segurança social. A dívida pública é de cerca de 74 por cento e na próxima década poderá atingir 90 por cento, se não forem tomadas medidas acertadas no sentido de inverter a marcha. Existe por parte de democratas e republicanos umas inércia ideológica, em que os primeiros se opõem à reforma das pensões e da previdência social, e os segundos opõem-se ao aumento dos impostos e defendem os cortes na despesa pública. Posições muito difíceis, senão impossíveis de conciliar.
O problema do deficit surgiu quando o ex-presidente Ronald Reagan, republicano de antecedência democrata, decidiu diminuir os impostos e aumentar de forma drástica as despesas militares. A grande questão no presente não é o rearmamento, mas o aumento da esperança de vida, sua qualidade e aposentadoria da geração que nasceu após a Segunda Guerra Mundial e conhecida pelos “Baby boomers”. É de realçar que durante os próximos trinta anos, aposentar-se-ão por dia, cerca de dez mil americanos, que levará quiçá à insolvência dos Estados Unidos, se não forem efectuadas urgentemente profundas reformas nos sistemas de pensões e na política de previdência social.
O quarto facto tem a ver com a aprovação pelos republicanos do aumento dos impostos contra as suas convicções ideológicas, pela a primeira vez desde a presidência de George Bush, principalmente os membros do Congresso chegados ao “Tea Party” que tem fomentado uma autêntica revolução contra o crescente endividamento dos Estados Unidos, desde que Barack Obama assumiu a presidência. O triunfo dos republicanos e o apogeu do “Tea Party” nas eleições legislativas de 2 de Novembro de 2010, fez sentar no Congresso gente nova, idealista, não disposta a acordos, nem mesmo quando o problema é o da falência do Estado, e que criam todo o tipo de problemas que possibilite um acordo final entre democratas e republicanos nas próximas negociações.
O quinto e último facto refere-se ao sistema político americano que não funciona, dado criar muitos freios a quem governa, impedindo o presidente de tomar decisões se não tiver uma maioria qualificada no Senado ou não tiver o suporte do Congresso, pelo que a minoria republicana pode travar qualquer proposta de lei no Senado, se os democratas não tiverem a seu favor sessenta dos seus cem membros. Trata-se de uma situação não prevista na Constituição dos Estados Unidos, mas que limita de forma séria o poder do presidente, ao ponto da sua equipa de colaboradores terem de ser aprovados pelo Congresso, tendo-se convertido num instrumento de pressão por parte dos congressistas, com o intuito de atingir objectivos partidários e de outra natureza.
As propostas como a de reduzir as doações privadas nas campanhas presidenciais que enfraqueceriam o poder das influências que daí advém, e as de unificar os mandatos do presidente e dos congressistas para que o presidente tenha o controlo do Congresso têm sofrido todo o antagonismo. A duração do mandato e o formato dos distritos da “Câmara dos Representantes”, que os políticos aprimoram a seu belo gosto em cada década, e segundo os seus interesses partidários, são as grandes causas da paralisia do sistema político americano.