
“Radical politics should concern “life” issues and be “generative”, allowing people and groups to make things happen; and democracy should be envisaged in the form of dialogue, controversial issues being resolved through listening to each other”.
Hegemony and Socialist Strategy: Towards a Radical Democratic Politics
Ernesto Laclau and Chantal Mouffe
A análise das correntes do pensamento sociológico, filosófico e político da história das instituições e a praxis política das personalidades que moldaram as diferentes formas de exercício do poder, em particular, desde o passado século, mostra as alterações que a democracia foi sofrendo e o consequente uso de identificações, rótulos e definições, que desfiguraram o sentido original das palavras e que derivaram em más práticas políticas e criaram em muitas partes do mundo um circulo vicioso.
O populismo é revivido, actualmente, por todo o mundo, como resultante da crise internacional e da ideia que a sociedade tem da sua verdadeira essência. É um conceito político, que pode ser definido como conjunto de ideias heterogéneas, que têm como característica comum a antipatia verbal ou real aos grupos económicos e intelectuais dominantes, partidos políticos, delação da corrupção do poder por meio das classes privilegiadas e a constante solicitação de apoio do povo, como origem do poder, em todas as grandes decisões tomadas pelos líderes que governam.
Os líderes caracterizam-se por usarem um discurso emocional de persuasão do “povo” de apenas trabalharem para o seu bem-estar e progresso, funcionando como santos protectores, no sentido negativo do conceito. O termo era em geral conotado com os grandes populistas russos e americanos do século XIX. O mundo ocidental é apenas um, e existem tonalidades próprias de populismo que se diferenciam de acordo com o local ou país onde surgem.
O filósofo e cientista político, Karl Marx, chama de bonapartismo. O fundador da sociologia, Max Weber, dá-lhe o nome do cesarismo plebiscitado. Muitas vezes conotado com o fascismo, pois é apelidado como populismo as propostas mais autoritárias do partido do governo. É um uso estranho e distorcido no sentido mais comum.
É chamado de populismo às tendências caudilhistas, com traços autoritários, geralmente de esquerdas. É reservado o termo fascismo para descrever as tendências caudilhistas, igualmente, com características autoritárias, em geral de extrema-direita. Assim, Fidel Castro é um populista e o general Francisco Franco, fascista. O político italiano Benito Mussolini, líder do “Partido Nacional Fascista” que governou a Itália de 1922 a1943, inaugurou tal prática política, caracterizada por um nacionalismo exacerbado, corporativismo, feroz anticomunismo, censura e propaganda.
Ainda que apresentando forma distinta de exercício do poder, Adolfo Hitler é considerado igualmente, como fascista. A diferença entre populismo e fascismo resume-se ao facto de que ambas as correntes de pensamento, propõe soluções político-sociais de cariz autoritário para os problemas de um país, que não se enquadram nos sistemas legais e democráticos tradicionais, em que o primeiro acerca-se do povo para ganhar eleitores, e o segundo para o oprimir.
O populismo é prestigiado pelo politólogo Ernesto Laclau, que desenvolve no livro “Hegemony and Socialist Strategy: Towards a Radical Democratic Politics”, escrito em conjunto com Chantal Mouffe, politóloga belga, e considerado como o alicerce do pós-marxismo. O populismo surgiu no Brasil, ligado ao primeiro consulado do presidente Getúlio Vargas que exerceu o primeiro mandato de 1930 a 1945 e o segundo de 1951 a 1954, caracterizado por um tipo de governo de aproximação excessiva do povo, satisfazendo os seus pedidos e conhecido por “pai dos pobres”, bíblica denominação criada pelo aparelho de propaganda do Estado.
Além do presidente brasileiro, podem considerar-se como da primeira era do populismo, o presidente da Bolívia, Victor Estenssoro, que exerceu o mandato por quatro vezes, nos períodos de 1952 a 1956, 1960 a 1964 (duas fases) e de 1985 a1989, fundador do “Movimento Nacionalista Revolucionário” que liderou durante 50 anos, tendo criado a “Revolução Boliviana”, em 1952, que transformou de forma radical o país, com repercussões em todo o continente. O seu quarto mandato foi caracterizado pela implementação de políticas económicas de cariz neoliberal.
A Argentina seguiu o populismo pela mão de Juan Péron, que exerceu o mandato de 1946 a 1955 e de 1973 a 1974, sendo o seu governo marcado pelo controlo da economia, nacionalização das principais empresas do país e atribuído amplas regalias aos trabalhadores.
A Colômbia mostrava tendências de seguir o populismo com Jorge Eliecer Gaitán, proclamado líder do Partido Liberal, em Outubro de 1947, que podia ter vencido as eleições presidenciais de 1949, caso não tivesse sido assassinado em 1948. O populismo veio a iniciar-se no país de forma anacrónica, com o presidente Gustavo Rojas Pinilla, que por meio de um golpe de estado, exerceu o mandato de 1953 a 1957, e que se caracterizou como de ditadura populista.
O Equador seguiu o populismo de José Ibarra, que exerceu o mandato presidencial cinco vezes, de 1934 a 1935, 1944 a 1946, 1952 a 1956, 1960 a 1961 e 1968 a 1972, convertendo em 1946 o seu regime em ditadura, tendo sido deposto pelo golpe de estado de 1947. O México, quanto ao populismo, foi defendido pelo “Partido Revolucionário Institucional” que deteve o poder dominante entre 1929 e 2000.
O populismo nas décadas de 1930 e 1940 tinham como “raison d'être”, a manutenção da ordem oligárquica contestada pela crise do modelo de exportação, não praticando a repressão, mas incorporando as classes populares (trabalhadoras) aos regimes políticos, evitando desse modo a revolução.
O sociológo italiano Gino Germani, na sua “Teoria da Modernização” afirmou que a primeira concepção do populismo ocorrida nas décadas de 1950 e 1960, deveu-se ao facto do desenvolvimento da América do Sul ter seguido um modelo diverso das democracias da Europa, pelo que a fragmentação da sociedade foi seguida de um veloz processo de industrialização e urbanização, pelo que as classes trabalhadoras teriam exigido maior participação no processo democrático, se não tivessem intervindo militarmente com regimes de ditadura ou nacionais populares.
A segunda concepção do populismo que ocorreu na década de 1970, afastou-se da “Teoria da Modernização” e os líderes populistas conseguiram sucesso por recurso a um modelo combinado de repressão e manipulação política com a satisfação das exigências das classes trabalhadoras.
É um mito acreditar que a América do Sul não consegue atingir um modelo de social-democracia como na Europa, dadas as especificidades de cultura, mentalidade, história e tradições que seriam muito originais e estranhas, senão exóticas, e o peronismo foi uma delas, por exemplo.
O peronismo foi um período de excepcionalidade da vida da Argentina, que existia mesmo antes de Juan Perón ocupar a presidência. Analisado esse período, o peronismo parece menos populismo e mais fascista de influência europeia. O “kirchnerismo” é um conceito usado para definir a “praxis” política do presidente argentino, Nestor Kirchner, falecido, e que exerceu o mandato de 2003 a 2007, dos seus apoiantes e da sua esposa, actual presidente, Cristina Kirchner, que exerce o mandato desde 2007, tendo sido reeleita o ano passado.
O “kirchnerismo” não é peronismo e não é democracia, porque o poder judicial está completamente destruído e o poder legislativo é uma pequena minoria que não tem poder para alterar o que quer que seja e o restante não é controlável.
Os populismos de Hugo Chavez, Fernando Correa, Evo Morales e de Cristina Kirchner parecem iguais, mas não são, tal como não existem países semelhantes. Hugo Chavez tem petróleo e Cristina Kirchner tem soja. Hugo Chavez tem um exército armado e disciplinado. Cristina Kirchner tem apenas um grupo de apoiantes improvisados, mas o modelo é o de Hugo Chavez.
O “kirchnerismo” assumiu que é moda condenar o peronismo, com excepção de Evita, defendida como mito de ter sido uma revolucionária e Juan Perón era um conservador. Actuavam de forma simbiótica, da mesma forma que fazem no presente, porque Nestor Kirchner, faleceu e querem os seus apoiantes dos últimos momentos fazer crer que ele era como Evita, o que se torna impossível porque Cristina Kirchner deprecia o peronismo e segue o modelo de Hugo Chavez, que por sua vez o adquiriu de Juan Péron, ou seja, sem saber a Argentina tem de novo o peronismo por meio da influência que Hugo Chavez exerce sobre Cristina Kirchner.