JORGE RODRIGUES SIMAO

ADVOCACI NASCUNT, UR JUDICES SIUNT

Ásia à boleia de uma locomotiva chamada China

“Late in 1978, Deng Xiaoping repeated in a speech an old Szechuan proverb - It does not matter whether a cat is white or black, as long as it catches mice. - Setting aside ideology in favor of pragmatism, this old wily revolutionary began the process of giving the future of China back to its children. Gradually beginning the parallel processes of decollectivization, marketization and opening up to the outside world, Deng Xiaoping unleashed two fundamental forces the people’s latent demand and Chinese entrepreneurial energy.”

James K. Yuann e Jason Inch
Supertrends of Future China

60anosO sexagésimo aniversário da fundação da República Popular Chinesa (RPC), marca o fim de um longo período de instabilidade e fragilidade. As seis décadas percorridas fazem da China, a terceira potência económica mundial, com o consequente peso decisório no plano das relações internacionais, podendo ser considerada a maior mudança económica da história realizada por um povo e um dos factos mais importantes do presente século.

A China desenvolveu-se sob a direcção do Partido Comunista. A evolução realizada foi complexa, farta de êxitos e fracassos e pode ser caracterizada por dois períodos e liderada por duas personagens. O primeiro, sob a batuta de Mao Tsé-Tung e designado de “maoísta”, decorreu entre 1949 e 1978, cujas prioridades foram eminentemente políticas, assinaladas por uma a mudança acelerada ao comunismo, luta de classes, acções que criaram turbulências sérias na sociedade, que é politizada, atingindo o pico máximo, na última década da sua vida com a Revolução Cultural. O legado do líder não se extinguiu e é parte da conformação da China mantendo-se no futuro por longo tempo.

O segundo período, entre 1978 e 2009, inicia-se sob a orientação do grande estratega da mudança, Deng Xiaoping, que pode ser considerado como o mentor e impulsionador da política de reforma, substituindo as prioridades políticas pelas económicas, tendo em vista a modernização do país. O sistema económico socialista, começa a sua marcha rumo aos princípios do capitalismo de mercado, mantendo todavia, uma forte intervenção estatal e eliminadas as comunas agrícolas. A China sai da pobreza rumo ao progresso.

A política de isolacionismo dá lugar à política de abertura ao comércio externo e investimentos. As relações internacionais passam da forma conflitual a outras mais pacíficas e consensuais. Obtém um alargado reconhecimento internacional e define um modelo de relações estável com o resto do mundo, e em particular com os países vizinhos, tendo em vista realizar o primordial propósito nacional, que é a modernização e o crescimento económico. A inter-relação da China com o mundo, quiçá o factor mais importante da política de reforma, sofreu um desenvolvimento admirável nos últimos trinta anos, rompendo essa tendência ao isolamento que tinha marcado o país durante séculos

A revolução chinesa foi uma revolução nacionalista, não revestindo as características puras e tradicionais que a possam definir como revolução comunista, dado que o pensamento não era edificar uma sociedade comunista, mas restabelecer a soberania, resgatar a unidade, acabar com a prostração e com as permitidas agressões externas.

O Partido Comunista através dos seus líderes, adoptou os papéis de regentes que no passado equivalia aos mandarins e tem sido a coluna vertebral do grande processo de transformação económica, que originou uma melhoria significativa nas condições de vida da população, conduzindo à maior revolução económica da história do país.

A China tem crescido a uma taxa média anual de cerca de 10%, nas últimas três décadas de reforma, numa marcha cadenciada, gradual e sem rupturas, não tendo criado condições para a existência de explosões reformistas, semelhantes às ocorridas na Europa de Leste, e que se caracterizaram por privatizações massivas ou liberalizações bruscas de preços. Libertou lentamente o seu sistema económico e progressivamente os preços. Permitiu a propriedade privada nas empresas. Sem momento significativo, qualitativo e planeado, a economia passou do modelo socialista para o modelo capitalista, mitigado pelo intervencionismo do estado, onde as empresas estatais representam um papel chave. Não se pode considerar que a economia chinesa seja socialista, uma vez que grande parte da sua produção é feita em condições de autêntico sector privado e comercializada a preços livres.

Enquanto, o Ocidente sofre o pior desastre financeiro desde a década de 1930, dando lugar à recessão, sofrendo as economias centrais uma colectiva contracção. As recentes agitações bolsistas mostram a outra face da moeda, dado que Xangai pode criar sérios prejuízos a Nova Iorque, Londres ou Frankfurt. Uma análise em termos de economia internacional onde se encontra inserida, e em relação com o crescimento médio anual de 3,7% em quarenta anos, um recuo de 1,5% no Produto Bruto Mundial (PBM), como o previsto, para o corrente ano é algo de espantoso. Num volume total de 64 mil milhões de dólares, a perda representa pouco mais de 3 mil milhões de dólares. Nunca antes a economia mundial tinha enfrentado uma queda tão grave e repentina.

A China deve tomar plena consciência do estremeção, pois só dessa forma, entenderá a ameaça de recessão ao seu modelo de crescimento baseado na exportação, de forma a não captar mensagens erradas e agarrar-se a estratégias arcaicas, julgando que terá uma reacção de tipo clássico no contorno da procura externa, podendo ser colocada numa posição delicada, face a uma saída firme do palco pós crise, dada a prolongada queda da procura mundial liderada pelos Estados Unidos.

Enquanto, a China crítica os Estados Unidos pelo seu abissal deficit fiscal e vício ao endividamento, que pode reduzir o valor dos seus investimentos em títulos do tesouro americano, vai defendendo uma completa reforma do sistema cambial internacional, mas se insiste demasiado nessa direcção, pode vir a desencadear uma crise do dólar que alargaria, ainda mais, os problemas do deficit americano e da crise mundial.

As estatísticas do Fundo Monetário Internacional (FMI) e da Organização Mundial de Comércio (OMC), demonstram que a fracção chinesa nas trocas comerciais a nível global, octuplicaram desde o inicio da política de abertura em 1978, o que faz duplicar ou triplicar o crescimento de outras economias no Leste e Sul da Ásia. Por outro lado, a China aumentou em 16%, no período de 2001 a 2007, o peso das trocas comerciais em termos de PIB.

Sendo um mercado emergente aberto, o comércio externo atingiu cerca de 65% em termos de PIB, pelo que não está em condições de dissimular alguns efeitos da crise global. Após um sério abalo das exportações em que o ritmo de aumento do PIB sofreu uma queda de 13,7% em 2007, para 6,8% no último trimestre do passado ano, e que na última previsão para o corrente ano pode vir a ser de cerca de 9% anuais. O governo tinha reagido, no final do passado ano, com uma vasta série de estímulos, no total de 590 mil milhões de dólares para o biénio de 2009/2010, denominado por projectos de infra-estrutura.

O governo pode fazer muito mais para incentivar o consumo interno, pois os efeitos práticos são demorados, numa economia que continua a crescer, ao contrário do efectuado em 1997/1998 e 2000/2001. Os incentivos praticados não são os suficientes para estimular a procura, que teve cerca de 40% de queda em termos de PIB, em 2007.

A China não oferece apenas os estímulos financeiros, mas também, adopta acções simétricas noutras partes do mundo, que podem vir a constituir um dos maiores perigos da sua estratégia. Se os consumidores americanos levarem tempo a superar a contracção de gastos e consumo, a China verá fracassados os seus objectivos.

Assim, a previsão geopolítica da sua macroestratégia dirigida às exportações pode vir a ser particularmente paradoxa, se não for cautelosamente estudada e revista.

As últimas previsões apontam um crescimento de 8% para o corrente e próximo ano.

A grande zona de crescimento será a Ásia, no período de 2010 a 2013, com uma média anual de crescimento de 6%-7%, o que reflectirá a robustez do processo da China, como locomotiva do crescimento da região.

Jorge Rodrigues Simão, in HojeMacau, 30.09.2009

PS: Para baixar o suplemento do "HojeMacau" sobre os 60 anos da República Poular da China, clique aqui.

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